O momento atual é delicado para os trabalhadores e trabalhadoras que exercem as atividades essenciais, gerando dúvidas em relação a seus direitos, especialmente a respeito dos limites legais e éticos impostos no exercício do poder diretivo e organização da atividade empresarial.
Vários Estados e cidades do Brasil decretaram restrição das atividades não essenciais no ramo do comércio e indústria, inclusive determinando o fechamento e paralisação parcial das atividades. Nestes casos, visando à proteção da população em geral e dos próprios trabalhadores, a circulação de pessoas deve ficar restrita ao que for essencial, nos termos do Decreto nº 10.282/2020. Para quem descumpre essa determinação, pode haver a incidência de sanções administrativas e penais. É importante destacar que todas estas recomendações e estratégias para o combate da pandemia vêm sendo direcionadas pela autoridade máxima em saúde, a Organização Mundial da Saúde [1].
Apesar disso, estão surgindo relatos junto a diversos sindicatos do país, que informam a prática de assédio moral e abusos cometidos por algumas empresas, que têm obrigado os trabalhadores a se locomoverem até o trabalho para desenvolverem as suas funções de forma presencial sem fornecer para isso o EPI adequado, como máscaras, luvas e álcool gel, para diminuir o risco do contágio do trabalhador.
Há exemplos de empresas no ramo de call center, que possuem condições financeiras e recursos tecnológicos para permitir o trabalho em home office, conforme previsão do art. 75-A da CLT, mas ainda assim têm requerido dos trabalhadores o trabalho presencial[2].
Não bastasse isso, também há relatos de trabalhadores que continuaram suas atividades, mesmo apresentando sintomas de contaminação pela Covid-19, o que é grave e pode levar à contaminação e adoecimento de outros funcionários no local de trabalho.
Também vale lembrar aqui que geralmente quem está em uma posição hierárquica superior e toma as decisões para a organização, em regra, não se utiliza dos mesmos serviços públicos que os trabalhadores [3]. Explica-se: é mais comum o gestor se utilizar de transporte individual próprio, ou ter a faculdade de realizar home office. Dois pesos, duas medidas. Por um lado, há a imposição da realização do trabalho presencial aos empregados, e por outro as ordens são definidas remotamente.
No ensinamento da professora Vólia Bonfim Cassar, o assédio é “o termo utilizado para designar toda conduta que cause constrangimento psicológico ou físico à pessoa”. Já o assédio moral é caracterizado pela prática de “condutas abusivas praticadas pelo empregador direta ou indiretamente, sob o plano vertical ou horizontal, ao empregado, que afetem seu estado psicológico”.
A CLT (art. 223) e o Código Civil (art. 186 e art. 927) trazem previsão sobre os danos morais que podem ser ocasionados na relação empregatícia, trazendo a possibilidade de responsabilização do empregador.
De igual forma, a CLT também prevê, no art. 483, a possibilidade de rescisão indireta do contrato de trabalho, que é a justa causa aplicada à empresa pelo empregado. Na hipótese de o empregador não fornecer o EPI necessário para dirimir os riscos pelo contágio, o empregado poderá pleitear o rompimento do contrato e a indenização conforme alínea “c” do art. 483 da CLT.
Trabalhadores e trabalhadoras, denunciem! Se o empregador não reduzir os riscos inerentes ao ambiente de trabalho, ou passar a impor regras que violem as recomendações do Ministério da Saúde e da OMS expondo sua saúde ao risco de contágio pelo coronavírus, entre em contato com o sindicato da categoria ou o Ministério Público do Trabalho. Além disso, é possível pleitear judicialmente indenização por assédio moral e, nos casos mais graves, até mesmo a rescisão indireta do pacto laboral.
Campinas, 13 de abril de 2020.
REFERÊNCIAS
1 https://www.who.int/news-room/q-a-detail/q-a-coronaviruses
2 https://www.osaogoncalo.com.br/geral/79758/funcionarios-de-empresa-de-telefonia-relatam-assedio-moral-por-parte-da-gerencia
3 https://www.youtube.com/watch?v=C4eUMFJ9nQg
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