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Bolsonaro deixou país vulnerável à fome e “preço será alto” na pandemia, diz Graziano

“Muita gente vai morrer de fome se não morrer do coronavírus”, diz ex-diretor da FAO

José Graziano esteve à frente da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) como diretor-geral entre 2012 e 2019 – FAO.


O desmonte das políticas de segurança alimentar iniciado na gestão de Michel Temer (MDB) e aprofundado durante o governo de Jair Bolsonaro (sem partido) deixaram o Brasil em uma posição de fragilidade para garantir a alimentação adequada da população em meio à pandemia do novo coronavírus.

Na avaliação do ex-diretor da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), o agrônomo José Graziano, o preço que será pago pela falta de prioridade nas políticas de combate à fome e à segurança alimentar no país é “altíssimo”.

“Exatamente essa falta de prioridade que atinge o país no momento dessa pandemia, até remontar, reconstruir esse sistema, até fazer voltar as engrenagens funcionarem adequadamente, azeitar esse mecanismo todo, pagaremos um preço alto, altíssimo, de muita gente que vai morrer de fome se não morrer do coronavírus”, alertou em entrevista ao Brasil de Fato.

Mapa da Fome

Graziano esteve à frente da FAO como diretor-geral entre 2012 e 2019. Foi nessa condição que anunciou, em 2014, que o Brasil deixava o Mapa da Fome da Organização das Nações Unidas (ONU).

Naquele ano, 4,5% da população vivia abaixo da linha de extrema pobreza, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o que levou o país a atingir a marca de menos de 5% da população em condição de insegurança alimentar.

“Hoje eu vejo com muita tristeza que o Brasil está no caminho de volta ao Mapa da Fome por exatamente deixar de cumprir os elementos principais de uma política de segurança alimentar. O governo Bolsonaro tem continuado o desmonte, mais explícito no caso, que começou no governo Temer”, lamenta Graziano.

Em 2018, ao final do governo de Michel Temer, o país já apresentava 6,5% de sua população abaixo da linha de extrema pobreza, chegando a 13,5 milhões de pessoas nessa condição. Estimativas apontam que, em 2019, esse número chegou a 13,88 milhões de pessoas. Projeções do Banco Mundial apontam que até o final deste ano esse número deve chegar 14,7 milhões, o que representa 7% da população brasileira.

“Pobreza extrema é um eufemismo para miséria, que é aquela situação onde as pessoas não conseguem comprar nem a cesta básica necessária para sua alimentação. Se nós aumentarmos de 5 a 6 milhões realmente o número de miseráveis no país, isso nos leva a uma proporção da população de 7%, sem dúvida alguma mais que suficiente para fazer voltar ao Mapa da Fome”, ressalta.

Pandemia

Com o desmonte da política de segurança alimentar, o monitoramento em relação ao número de pessoas sujeitas à fome no país também ficou comprometido. “Isso é ainda mais grave frente à situação de desabastecimento que começa a ocorrer nos grandes centros urbanos por conta do isolamento social nas grandes metrópoles e para as comunidades e povos tradicionais, como indígenas, ribeirinhos e quilombolas”, aponta Graziano.

A falta de informações também afeta o direcionamento das políticas voltadas para o combate à fome, como o Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar (PAA) com compra e doação simultânea, modalidade do programa em que o governo federal compra diretamente do agricultor e doa para populações em situação de vulnerabilidade por meio de associações que atendem esse público.

Como proposta para enfrentar os efeitos da pandemia na produção de alimentos, organizações de trabalhadores rurais apresentaram a proposta de um Plano Safra Emergencial que, entre outras medidas, propõe a destinação de R$ 1 bilhão do orçamento para essa modalidade do programa implementada por meio da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), mais R$ 2 bilhões para a implementação do PAA via estados e municípios.

Por meio da Medida Provisória nº 957/2020, editada no último dia 27 de abril, o governo anunciou o aporte de R$ 500 milhões para o PAA. Em ofício encaminhado ao Ministério da Cidadania no início do mês, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC/MPF) concluiu que a medida não garante nem a metade dos recursos necessários para a segurança alimentar do país no período de pandemia, segundo informou o repórter Fausto Macedo do jornal O Estado de S. Paulo.

Graziano avalia que a resposta do governo tem sido lenta frente à pandemia e considera que o dinheiro pode demorar para chegar na mão dos agricultores, a exemplo do que acontece em relação ao auxílio emergencial de R$ 600. “Não é fácil cadastrar e agilizar o pagamento de um volume tão grande de trabalhadores se nós não temos uma infraestrutura de apoio, se essa estrutura foi sendo sucateada, negligenciada no período anterior”, ressalta.

Por se tratar de uma situação emergencial, ele alerta que a demora na resposta do governo pode ter consequências drásticas.

“Nessa situação de emergência, se nós não conseguirmos responder adequadamente, a médio e longo prazo estaremos todos mortos. Nós precisamos concentrar a resposta agora imediata e essa resposta imediata tem um sistema que ainda perdura de segurança alimentar e nutricional e que deveria ser agilizado”, ressalta.

Além da demora na resposta para enfrentar os efeitos imediatos da pandemia, o país está sem estoque público de alimentos para conter a alta dos preços no momento em que ocorrer a saída do isolamento social. “Esse é um alto preço que nós estamos pagando pelo desmonte da política de segurança alimentar que estava em curso pelo atual governo. Não há estoques. A Conab [Companhia Nacional de Abastecimento] tem estoque zero de feijão, quase zero de arroz e quando tem é localizado na região Centro-Sul. Nós vamos ter esse problema da especulação com produtos da agricultura familiar e com produtos frescos, como frutas, verduras, legumes, entre outros”, aponta.

Confira a entrevista completa:

Brasil de Fato: Em 2019, no momento em que deixou a direção geral da FAO, como estava, em termos gerais, a situação da fome no mundo?

José Graziano: Em 2019, a fome já vinha aumentando no mundo, como os relatórios da FAO deixavam claro. Eu divido em dois períodos o tempo que estive à frente da FAO. Quando assumi, em 2012, iniciamos um processo descendente dos aproximadamente 1 bilhão de pessoas famintas à época. Nós conseguimos reduzir a 800 milhões em 2015. Na época, o objetivo do desenvolvimento do milênio era o nosso grande guia. E 72 países conseguiram cumprir a meta de reduzir a fome pela metade no período que eu estive à frente da FAO, que era o objetivo do milênio. O objetivo do milênio não era erradicar a fome, era reduzir pela metade e, infelizmente, deixava a grande pergunta sobre o que nós tínhamos a dizer à outra metade. Por isso saudamos com entusiasmo o aparecimento dos objetivos do desenvolvimento sustentável número 2, que propôs a erradicação da fome.

Infelizmente, quando colocamos de acordo erradicar a fome em 2016, 2017 e 2018  a fome passou a aumentar novamente. Um aumento pequeno, um aumento em termos absolutos e não em termos relativos, continua, com uma proporção de 11% de pessoas no mundo passando fome, mas com um aumento do número de pessoas famintas.

E isso se deveu basicamente a dois elementos centrais. Primeiro, os conflitos e guerras. Quando eu saí da FAO, duas de cada 3 pessoas que passavam fome viviam em países em situação de conflito. Segundo, a crise de 2008 e 2002 que deixou um rastro de destruição nos países em desenvolvimento, principalmente naqueles mais pobres como os países da África, a fome voltou a crescer por questões econômicas.

Como a pandemia mudou esse quadro?

A pandemia exige uma atenção concentrada não apenas da FAO, mas de todas as organizações do sistema Nações Unidas. E uma atenção redobrada no sentido de que não basta apenas dar orientações e conselhos. As organizações do sistema Nações Unidas precisam ser mais operativas porque grande parte dos países mais pobres não tem a capacidade operacional de enfrentar essa nova situação colocada pela pandemia.

Eu costumo dizer que nós não estamos em mais uma recessão econômica como foi a de 2008 e 2010, não é um elemento interno ao sistema econômico que entrou em recessão. A pandemia é uma catástrofe de causas externas que está nos levando a uma depressão similar a da Segunda Guerra, o que exige uma intervenção massiva como foi feita pelos Estados Unidos para sair da guerra com o plano Marshall. Eu tenho defendido que nós precisamos de um plano Marshall agora focado basicamente em três políticas: saúde, alimentação e educação.

Que importância tiveram as políticas de segurança alimentar no Brasil na última década?

A importância nós vimos claramente, foi tirar o Brasil do Mapa da Fome. Um país que exporta alimentos até mesmo para poder fazer o seu marketing, ele não pode exibir um número de famintos como tinha o Brasil no início dos anos 2000. Esse sucesso da política de segurança alimentar e nutricional no Brasil pode ter levado a um certo desleixo ou uma preocupação menor com o tema, mas isso é um grande erro político e estratégico. A segurança alimentar tem que ser uma política contínua, como é a política de saúde, como é a política de educação.

Aliás, acho que essas são as três grandes políticas que, neste momento,  que podem fazer a diferença nos diferentes países, como nós estamos vendo.

Qual foi a sensação de anunciar, como diretor-geral da FAO, a saída do Brasil do Mapa da Fome em 2014?

Minha sensação ao anunciar a saída do Brasil do Mapa da Fome foi de um grande alívio, no sentido de mostrar que é possível erradicar a fome em um país da dimensão do Brasil. As experiências que nós tínhamos antes eram de países desenvolvidos e de população muito menor. Um país em desenvolvimento com uma população de 200 milhões conseguir sair do Mapa da Fome em menos de uma década é uma grande vitória que mostrou que é possível uma política de segurança alimentar levar à erradicação completa da fome.

Como se sente hoje ao olhar a situação de segurança alimentar no país?

Hoje eu vejo com muita tristeza que o Brasil está no caminho de voltar ao Mapa da Fome por exatamente deixar de cumprir os elementos principais de uma política de segurança alimentar. O governo Bolsonaro tem continuado o desmonte, de forma mais explícita, iniciado no governo Temer, de não priorizar as políticas de segurança alimentar, isso inclui a extinção do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), isso inclui a redução dos recursos para compras da agricultura familiar, inclui também a redução da política de alimentação escolar que vinha se ampliando nos últimos anos.

Qual é a perspectiva do Brasil frente à pandemia do novo coronavírus?

Como disse anteriormente, o governo Bolsonaro tem sido mais explícito no desmonte da política de segurança alimentar construída no primeiro governo Lula e que foi responsável pela saída do Brasil do Mapa da Fome. Nessa circunstância de desmonte da política de segurança alimentar e nutricional no Brasil não há dúvida de que nós corremos o risco de voltar ao Mapa da Fome ainda em 2020 com os efeitos dessa pandemia.

Tratar o tema da agricultura familiar e combate à fome como tema de menor relevância, de menor importância, tratar politicamente como de menor importância é dizer que não é prioritário do governo. Exatamente essa falta de prioridade que atinge o país no momento dessa pandemia, até remontar, reconstruir esse sistema, até fazer voltar as engrenagens funcionarem adequadamente, azeitar esse mecanismo todo, pagaremos um preço alto, altíssimo, de muita gente que vai morrer de fome se não morrer do coronavírus.

Os números que se desenham para o impacto da pandemia no Brasil são cada dia maiores, a cada dia eu vejo o governo revisando as suas avaliações e chegando a números próximos aos estimados pelas agências internacionais, como a queda de 4,7% no PIB, que se aproxima do valor já estimado anteriormente pela Cepal [Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe], pelo Banco Mundial e outras organizações internacionais, esse modelo politicamente representa uma exclusão ainda maior dos mais pobres.

Eu tenho visto algumas projeções assustadoras para este ano ainda, 2020. Entre elas, uma que mostra um aumento de mais de 5 a 6 milhões de pessoas na pobreza extrema. Isso indica que pobreza extrema é um eufemismo para miséria, que é aquela situação onde as pessoas não conseguem comprar nem a cesta básica necessária para sua alimentação. Se nós aumentarmos de 5 a 6 milhões realmente o número de miseráveis no país, isso nos leva a uma proporção da população de 7%, algo, sem dúvida alguma, mais que suficiente pra fazer voltar ao Mapa da Fome.

Isso nos leva a um aumento da proporção de miseráveis no país de 4,4% existente em 2019 pra mais de 7%, o que seria sem dúvida suficiente pra fazer voltar ao Mapa da Fome. Vale lembrar que o Mapa da Fome lista aqueles países que tem mais do que 5% da população em estado de segurança alimentar severa ou fome.

Entre as propostas apresentadas pelos pequenos agricultores está o aporte de R$ 3 bilhões para o PAA, sendo R$ 1 bilhão via Conab e o restante dividido igualmente entre estados e municípios. O governo federal deve realizar um aporte de R$ 500 milhões no programa. Essa medida é suficiente para responder à crise nesse momento?

O governo tem reagido muito lentamente pra reativar o PAA. Inicialmente, estavam previstos um pouco mais de R$ 200 milhões pra aquisição de produtos da agricultura familiar e agora o governo deve realizar um aporte de R$ 500 milhões no programa.

A proposta da sociedade civil é de R$ 1 bilhão para o PAA via Conab, que é o mecanismo mais eficiente, mais R$ 1 bilhão e R$ 2 bilhões para o PAA via estados e municípios. Eu acho que a grande questão é a rapidez para a implementação dessa resposta. Como nós temos visto no caso do pagamento dos recursos para os trabalhadores do setor informal e mesmo nas parcelas suplementares do Bolsa Família, a resposta do governo tem sido lenta. Não é fácil cadastrar e agilizar o pagamento de um volume tão grande de trabalhadores se nós não temos uma infraestrutura de apoio, se essa estrutura foi sendo sucateada, negligenciada no período anterior. Nós estamos pagando o preço do descaso com a política de segurança alimentar.

Como é possível monitorar a situação de segurança alimentar durante o período de pandemia, assim como a resposta da população às políticas públicas que estão sendo implementadas?

Com o desmonte da política de segurança alimentar, fica comprometido o monitoramento, nós só conseguimos ter algumas estimativas a partir dos dados de renda porque esses sim, felizmente, continuam sendo pesquisados pelo IBGE, pesquisas da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) e as pesquisas da escala de insegurança alimentar, que são realizadas periodicamente pelo IBGE numa periodicidade suficiente para avaliar a conjuntura corrente do país. Isso é ainda mais grave frente à situação de desabastecimento que começa ocorrer nos grandes centros urbanos, por conta do isolamento social nas grandes metrópoles e, para as comunidades e povos tradicionais como indígenas, ribeirinhos e quilombolas, significa que o PAA, programa de aquisição de alimentos com compra e doação simultânea, que era a grande política que substituiu as cestas básicas, também fica comprometida.

Nós infelizmente estamos na iminência de voltar a distribuição das cestas básicas, um recurso extremo, que além de tudo desestimula a produção local de alimentos. Nós tínhamos conseguido superar isso com o PAA de doação simultânea, grande política inovadora nesse sentido no início dos anos 2000.

Que outras ações podem ser pensadas a médio e longo prazo?

Vou ser um pouco irônico e dar a mesma resposta do Keynes, nessa situação de emergência, se nós não conseguirmos responder adequadamente, a médio e longo prazo estaremos todos mortos. Nós precisamos concentrar a resposta imediata agora e essa resposta imediata tem um sistema que ainda perdura de segurança alimentar e nutricional e que deveria ser agilizado.

Dois programas em particular, primeiro, o da merenda escolar com compras locais da agricultura familiar. Esse é um programa que pode resolver a questão da alimentação e da qualidade dos alimentos das crianças sem correr o risco de nós aumentarmos brutalmente a obesidade, que hoje é uma das epidemias que assola o Brasil na área da saúde.

Outro programa é o programa de compras locais com doação simultânea. Esse programa foi criado, em 2002, para substituir o programa de cestas básicas que, além de tudo, desestimulava a produção local e era muito mais caro.

O programa da aquisição de alimentos com doação simultânea permite comprar do agricultor e doar imediatamente, é uma rede de solidariedade que se cria nesses momentos de entidades, de organizações, de sindicatos, das prefeituras que distribui rapidamente esse produto para as populações mais necessitadas. Então esses são os dois programas modelos que funcionaram muito bem no passado.

Nesse caso particular, é fundamental o papel da Conab [Companhia Nacional de Abastecimento]. A Conab é a cabeça desse sistema, sem a Conab é como cortar a cabeça do sistema de segurança alimentar hoje no Brasil. Nós precisamos fundamentalmente desse braço operacional, que é a Conab, e do Consea, que é o organismo de planejamento e aconselhamento do governo.

A Conab tem sofrido um processo de enxugamento desde a gestão de Michel Temer, que se acentuou durante o governo Bolsonaro com o anúncio da venda de 27 regionais de abastecimento nos estados. Qual a importância dos estoques públicos de alimentos para enfrentar uma crise e como isso impacta a situação de segurança alimentar?

Esse é um alto preço que nós estamos pagando pela desmonte da política de segurança alimentar que estava em curso no atual governo. Não há estoques. A Conab tem estoque zero de feijão, quase zero de arroz e, quando tem, está localizado na região Centro-Sul, particularmente Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.

Então, a redistribuição desses estoques tem um preço que poderia ter sido evitado se tivéssemos estoques descentralizados formados com compras anteriores da agricultura familiar. O estoque regulador tem um papel fundamental, que é evitar a especulação na saída do isolamento. Nós vamos ter esse problema da especulação com produtos da agricultura familiar e com produtos frescos, como frutas, verduras, legumes, entre outros. E também no caso do tradicional arroz e feijão, nós temos que recompor rapidamente esses estoques, e agora é o momento da safra. Nós estamos colhendo o feijão no Brasil inteiro, colhendo arroz em boa quantidade do Centro-Sul do Brasil, podemos fazer os estoques reguladores pra enfrentar o momento seguinte, que é o da saída do isolamento social.

Qual impacto a crise deve ter nas commodities brasileiras?

Felizmente, a produção de commodities não deve ser impactada, as exportações brasileiras tem tudo pra se manter, exceto as restrições de portos nos países importadores. Alguns países da Europa, por exemplo, já começaram a criar restrições para importações de vários produtos. Mas, do lado brasileiro, a colheita deve se processar normalmente, até porque são grãos com colheita mecânica, que exige um pequeno número de trabalhadores rurais e não vejo nenhuma perspectiva de desabastecimento nesse sentido ou redução das exportações brasileiras de commodities.

Quais o senhor considera os principais legados de sua gestão à frente da FAO e qual o papel da agência hoje em um momento de combate à pandemia no mundo? 

Considero que dois são os legados da minha gestão frente à FAO. O primeiro foi ter centrado no tema da alimentação. Quando eu cheguei a FAO cuidava do agrícola e do rural, como eu chamava era o gueto, poucas pessoas estão no rural agrícola hoje no mundo. Eu procurei colocar a alimentação como o eixo central, para fazer juz ao nome, eu sempre repetida que a FAO chama Food and Agriculture [Alimentação e Agricultura] e não o contrário.

Por muitas razões os nossos fundadores colocaram a alimentação como primeiro e fundamental tópico da FAO justamente visando erradicar a fome no mundo, o segundo legado foi ter descentralizado a instituição.Quando eu cheguei os técnicos da FAO estavam todos em Roma, é muito bonito ficar sentado em frente ao Circo Máximo no prédio do QG central da FAO. Quem precisa da FAO são os países da periferia, da África, Ásia e América Latina. Fazer a FAO se voltar pra isso de maneira prioritária acho que foi uma grande contribuição, até mesmo pros dias de hoje, pra poder enfrentar melhor essa pandemia.


Edição: Vivian Fernandes

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