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Fakes e fatos sobre o serviço público e a reforma administrativa.

Por Rita Serrano

Em 3 de setembro passado o Poder Executivo encaminhou ao Congresso Nacional a PEC – Proposta de Emenda à Constituição – nº 32, que “altera disposições sobre servidores, empregados públicos e organização administrativa”.

Dentre as alterações pretendidas para o serviço público está o fim da estabilidade, ampliação da terceirização de serviços e mão de obra e fim dos concursos, podendo ser feito processo seletivo simplificado com contrato por prazo, corte de benefícios e carreira.

A PEC vai além e propõe carta branca ao Executivo, reduzindo o poder do Congresso Nacional para criar ou extinguir ministérios e órgãos da administração pública, universidades federais e órgãos fiscalizadores.

Determina, ainda, que as estatais não poderão assegurar em negociação ou acordo coletivo estabilidade e uma série de garantias aos empregados, na maioria regidos pela CLT.

A nova alteração no art. 173 que prevê “vedar ao Estado instituir medidas que gerem reservas de mercado que beneficiem agentes econômicos privados, empresas públicas ou sociedades de economia mista” ou que “impeçam a adoção de novos modelos favoráveis à livre concorrência” proíbe o monopólio estatal. A justificativa que acompanha a proposta afirma que o objetivo é “reforçar” a importância da livre iniciativa para o desenvolvimento da economia.

A proposta contém pressupostos que são fakes; vamos aos fatos:

• O Brasil tem muitos servidores públicos. Não é verdade. Em levantamento feito pela OCDE com 30 países o Brasil foi apenas o 26º no tamanho do serviço público • Todo servidor ganha muito. Segundo dados da Atlas do Estado Brasileiro, servidores do Poder Executivo, ganham em média R$ 3,9 mil e, nos municípios, R$ 2,9 mil. Destaque para o fato de que a grande maioria dos servidores tem curso superior e especialização (médicos, professores e outros). Os salários mais elevados estão em algumas funções superiores, no Poder Judiciário e Legislativo, setores que o governo deixou de fora da PEC, além dos militares. • As despesas com pessoal do governo estão fora de controle. As despesas com pessoal e encargos da União se encontram hoje no mesmo patamar de vinte anos atrás (4,4% do PIB), como mostra o Atlas do Estado Brasileiro, do IPEA. • Servidores não podem ser demitidos. Pelos termos da lei 8.112, para terem estabilidade servidores precisam ser avaliados por 3 anos (estágio probatório) e depois disso também podem ser demitidos, por falta grave. A estabilidade é fundamental para manter a continuidade dos serviços públicos e impedir a partidarização, com a sucessão de diferentes governos. • O texto fere o direito à livre negociação ao cercear negociações que envolvam estabilidade de empregados de estatais, boa parte regida pela CLT. • O objetivo com relação a limitar o papel das estatais é claro: favorecer a iniciativa privada, dessa feita diminuindo o poder do Estado em atuar no desenvolvimento do Brasil por meio de instrumentos de políticas públicas e econômicas. É mais uma medida que visa justificar a privatização do patrimônio público. • Interessante falar em coibir monopólio estatal quando se permite que o mesmo aconteça com grandes grupos privados que controlam áreas estratégias, como empresas de mídias digitais, de TV, setores alimentícios, bancos e tantos outros, sem que haja nenhuma política para fiscalizar tal prática.

O conceito desse projeto e de todos os outros desse governo é o mesmo, retirar direitos trabalhistas, destruir tudo o que é público, coletivo, para todos, voltado para as necessidades da população, dessa forma privilegiando o mercado privado, as multinacionais, os fundos de investimentos, o agronegócio, os interesses dos rentistas e privilegiados.

No centro do debate está a definição do papel do Estado, tema que ganhou mais relevância no mundo após a pandemia. Afinal queremos um Estado para todos ou para poucos privilegiados que enriqueceram na pandemia enquanto a maioria da população ficava desempregada?

Na crise, até os mais convictos liberais, os que alardearam o Estado mínimo, a luta contra a corrupção, que sempre defenderam privatização, são os primeiros a buscar a salvação no setor público, apropriando-se de recursos que pertencem a toda a sociedade. Frase de Noam Chomsky retrata essa realidade: “O governo não é a solução quando se trata do bem-estar da população, mas é claramente a solução para os problemas da riqueza privada e de poder corporativo”.

Os servidores públicos e empregados de estatais têm papel fundamental na construção da cidadania, na garantia de direitos fundamentais como saúde, educação, moradia, acesso aos alimentos; enfim, na possibilidade de uma vida melhor e mais justa para a população.

Ao pretender renunciar ao controle público de setores estratégicos o Brasil atua em descompasso com o processo de reestatização pelo qual passam os países mais desenvolvidos. De acordo com o Instituto Transnacional (TNI, 2020), nos últimos anos ocorreram 1.400 casos de serviços estatizados em mais de 2.400 cidades em 58 países, entre eles os Estados Unidos, Japão, França, Alemanha e outros.

Se é público, é para todos.

Rita Serrano é coordenadora do Comitê Nacional em Defesa das Empresas Públicas, representante dos empregados da Caixa no Conselho de Administração e mestre em Administração

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